Lembrança do dia em que fui a um boteco e comprei um bolo

Mulher do outro lado
tem olhos fatais
A massa do bolo
Tem pêssego e mais.

Na mesa fria
um café sem cor
medo no açúcar
no gosto, terror.

Garfo hesitante
partindo o glacê
e ela sorri quando
você não vê.

A sobremesa
tem olhos também
um bolo ou um braço
não conte a ninguém.

Olhar gelado
encanta e atrai
tão belo, esquisito
assusta o cara ali atrás.

Café morninho
amargo o sabor
meu tédio é doce
paranoia e calor.

Ás sobre mesa
dos olhos, porém
percebe o recado
não conte a ninguém.

Colher tremendo
na boca a maçã
um suco, um veneno
noite sem manhã.

Carta que insulta
palavras banais
a voz é um susto
fantasmas reais.

A submersa
tem olhos de quem
conhece o arbusto
não conte a ninguém.

O som que me jaz
no tão fundo do bar
o medo me dança
num pulso polar.

Pêssego doce
terrível sabor
no rosto que enfrente
a cor do pavor.

A sobremesa
tem olhos também
um beijo e um abraço
não conte a ninguém.